Mesmo a Coreia do Sul possuindo uma das maiores disparidades salariais entre homens e mulheres, superior a 30%, o país é comandado por uma liderança que defende os direitos dos homens que planeja, inclusive, abolir o Ministério da Igualdade de Gênero da Coreia do Sul. As mulheres coreanas enfrentam frequentemente fortes pressões sociais para abandonarem as suas carreiras após o parto e crimes sexuais contra mulheres são recorrentes em sistema de justiça criminal que muitas vezes parece dar sentenças leves aos perpetradores. Ao saber dessas informações, faria sentido imaginar que o movimento feminista estivesse crescendo no país, entretanto, o assunto é tão abominado pela sociedade coreana que muitas mulheres têm medo serem vistas apoiando o movimento e serem discriminadas. O feminismo transformou-se então, num conceito negativo associado ao comportamento radical, uma percepção que ganhou força em comunidades online populares dominadas por homens, e agora na sociedade em geral.
Em 2022, Yoon Suk Yeol foi eleito presidente no país, sendo popular principalmente entre os eleitores mais jovens e do sexo masculino. Com sua promessa de abolir o Ministério da Igualdade de Gênero e Família, o presidente alega que a discriminação é uma questão individual, não estrutural e que o ministério que trata homens como “potenciais criminosos sexuais” já não tem razão de existir. Yoon culpa o feminismo, também, pela baixa taxa de natalidade do país e negou a existência de “discriminação estrutural baseada no gênero”. Em janeiro de 2023, o ainda não abolido Ministério anunciou um plano para rever a atual lei sobre violação na Coreia para incorporar a “estupro não consensual”, mas este plano foi retirado em apenas algumas horas. Este plano foi uma tentativa de alterar a atual lei sobre violação, que considera apenas a violência ou a intimidação como requisitos para violação ou agressão sexual, para cumprir o padrão global recomendado pelas Nações Unidas, mas esta tentativa foi pouco depois anulada pelo Gabinete do Presidente da República.
Atual presidente sul coreano, Yoon Suk Yeol.
A 5 anos atrás a relação do governo com o feminismo era totalmente diferente, durante as eleições de 2017, o apoio ao feminismo era uma tendência bipartidária. Mas no final do mandato do ex-presidente Moon Jae-in, a maré mudou drasticamente, com os eleitores antifeministas, especialmente os jovens na faixa dos 20 anos, emergindo como uma força política, torcendo por Yoon e pelo seu Partido do Poder Popular.
Na Coreia do Sul, um movimento antifeminismo está a se espalhar rapidamente online entre os jovens do sexo masculino, que começaram a identificar-se como uma minoria social ou “vítimas” do poder feminino. Estes grupos argumentam que os movimentos feministas têm discriminado os homens e forçado as pessoas a tratá-los desfavoravelmente. A sua antipatia pelo feminismo vem do fato desses homens considerarem o feminismo não uma luta por diretos e liberdade e sim uma "supremacia feminina". Esses homens jovens consideram que a sociedade atual é desfavorável não com as mulheres e sim em relação aos homens e em muitos aspectos, como o exercício militar obrigatório somente a homens e outros assuntos, incluindo namoro e casamento, emprego e promoção, e aplicação da lei, especialmente, pasmem, para crimes sexuais.
O padrão de beleza coreano é considerado pelas mulheres injusto e inadequado. Existe um estigma contra mulheres que não usam maquiagem ou que têm cabelo curto e essas características agora são atribuídas ao feminismo. Num caso notável, nos Jogos Olímpicos de Tóquio em 2021, a arqueira sul-coreana An San tornou-se alvo de abusos online por parte de antifeministas que alegavam que o seu penteado indicava que ela era uma feminista radical. Quando até o penteado pode tornar-se motivo para abusos verbais e acusações de ódio aos homens, muitas jovens na Coreia do Sul têm medo de falar abertamente sobre os direitos das mulheres e apoiar a causa. Por esta razão, muitas feministas trabalham online anonimamente, já que as que trabalham publicamente recebem regularmente xingamentos e ameaças de morte.
Arqueira sul-coreana, An San.
Artistas, não por coincidência, em sua maioria do sexo feminino, sofrem boicotes até mesmo para as ações mais sutilmente feministas. A atriz Naeun, ex integrante do grupo feminino APINK, publicou uma foto com uma capa de celular que exibia a frase "meninas podem fazer qualquer coisa", Irene do Red Velvet leu um livro sobre o sexismo casual na sociedade sul-coreana, ambas foram duramente criticadas por estarem "promovendo" ideias feministas. A crescente veemência em relação às estrelas femininas que simplesmente demonstram qualquer interesse em melhorar os direitos das mulheres e o empoderamento feminino.
Apesar de toda a retaliação, o feminismo ainda resiste na Coreia do Sul. Desde o final da década de 2010, mulheres sul-coreanas têm lutado contra a cultura patriarcal do seu país com uma força sem precedentes. Através de um movimento local #MeToo, provavelmente o mais robusto de toda a Ásia, expuseram a má conduta sexual de muitos homens poderosos, incluindo o de um candidato presidencial. Elas lutaram vigorosamente por punições mais duras para crimes com câmeras espiãs. Elas fizeram campanha com sucesso para abolir a proibição do aborto que vigora há décadas no país. O feminismo sul coreano, ainda tem esperanças em construir um movimento estruturado e autônomo de mulheres para a transformação social que vá além das reformas institucionais ou da limitação do liberalismo, a fim de quebrar a opressão estrutural das mulheres coreanas.
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